(Novas da Galiza, nº41, Santiago de Compostela, xaneiro de 2012)

Metragem encontrada

Nos últimos anos, semelha que os filmes de foundfootage ou metragem encontrada
estám a fazer-se um oco no nosso panorama cinematográfico. Há ano e meio, o Cineclube
de Compostela dedicou-lhe várias sessons a este tipo de cinema, onde pudemos encontrar
documentários de compilaçom como Iraqi short Films, obras que componhem umha narrativa
de caráter mais ficcional como Rock Hudson's Home Movies ou Blockade, peças mais
vanguardistas como as curtas-metragens de
Matthias Müller ou um filme íntegro, deturpado mediante a adi çom de legendas, como
La dialectique peut-elle casser des briques? Como podemos ver, este tipo de cinema
oferece um grande problema terminológico e de definiçom, indo do documental para a
ficçom e passando polos filmes de caráter mais experimental. Na recente ediçom do
Cineuropa, pudemos ver a estreia de Vikingland, longa-metragem de Xurxo Chirro montada
com as filmagens do marinheiro Luís Lomba, e em ediçons anteriores do festival tivemos
a possibilidade de ver duas peças de Ramiro Ledo: CCCV, a partir de filmagens do cineasta
Carlos Varela, e O proceso de Artaud, remontagem de fragmentos do julgamento de
La passion de Jeanne d'Arc, de Carl Theodor Dreyer.
Dentro de toda a variedade estilística que oferta este tipo de cinema, quigéramos chamar
a atençom precisamente sobre este último filme; com data de 2010, O proceso de Artaud,
é em simultáneo umha amostra de found footage e umha adaptaçom literária.
A curta-metragem trata do julgamento que botou Antonin Artaud fora do Partido Comunista,
feito quase contemporáneo ao filme. Ainda que a maior parte de filmes remontados tratam de
atualizar as imagens para estabelecer um diálogo com o presente, Ramiro Ledo reutiliza os
primeiros planos do autor francês e remonta-os juntamente com os dos inquisidores,
reconvertidos aqui nas principais figuras do surrealismo, para encontrar umha certa
reminiscência passada daqueles feitos nas imagens tomadas por Rudolph Maté.
O cineasta galego retoma aqui umha das ideias já utilizadas em 2005 em CCCV: o atril como
elemento significante do cineastamontador. Daquela, as imagens  filmadas por Ramiro Ledo
recolhiam distintos debuxos e autocolantes do labor como desenhador de Carlos Varela,
completando o seu retrato com os anacos da sua obra. Cinco anos depois, em O Proceso
de Artaud
, o realizador expom no seu escritório os elementos constitutivos do seu novo filme:
o terceiro volume dos arquivos do surrealismo francês do qual é extraído a julgamento
(Adhérer au Parti communiste?) e sendas fotos de María Falconetti e do próprio Antonin Artaud.
O realizador reelabora assim, com sumo cuidado (já que nenhum dos planos originais se
encontra repetido na sua montagem), o filme que nunca mostrou
sobre as purgas internas a que André Breton submeteu o surrealismo. Em três significativos
planos, um de abertura do filme e outros dous antes e depois dos créditos, Ramiro Ledo fai
explícito o dispositivo de elaboraçom da obra através dum ato de enunciaçom. No primeiro
dos planos, encontramos umha foto de Falconetti, protagonista do filme de Dreyer; no segundo,
o próprio realizador extrai das páginas do livro outra instantánea com a face de Artaud.
Finalmente, no derradeiro plano do filme vemos a segunda foto por cima da primeira, e umhas
tesoiras símbolo por excelência da montagem, assinalam o que foi amputado ao filme e o que
o substituiu.

Julio Vilariño

 

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